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Teatro

Tony Reis: “Estamos sempre afirmando que o teatro é muito importante. É um ato político ir ao teatro”

Genilson Coutinho,
22/07/2024 | 11h07
Tony Reis_Foto_@jendoca

Astral sereno, sorriso no rosto e jeito brincalhão. É assim que o ator baiano Tony Reis vai contando sua história. Depois de tanto tempo de estrada, ele ainda se emociona ao ter a oportunidade de apresentar seu novo espetáculo em Salvador, sob os olhos de familiares e amigos que o viram crescer. 

Artista da periferia de Salvador, Tony é uma das figuras mais presentes no Teatro Oficina, um dos principais de São Paulo. Mas se engana quem pensa que o destino reservou uma estrada sem buracos e desvios ao longo dessa história. Em um clássico caso de “era pra ser”, o ator tinha uma veia artística pulsante. “Nunca foi sorte, sempre foi macumba. A gente sempre se prepara espiritualmente para tudo, né”, diz em tom brincalhão.

Ele se aventurou pela publicidade, gravou comerciais – gostava, mas ainda não era o que queria. “Eu quero entender mais o que é essa arte de interpretar. Eu fazia muitos comerciais, e isso me despertou a vontade de procurar um curso de teatro”, comenta.

Por pura sorte, por macumba ou por obra do destino, quando o elenco e produção de Malhação estavam em Salvador para gravar, Tony Reis, já conhecido pelos comerciais, foi convidado para dar uma pontinha na novela. Depois disso, tudo mudou: ele descobriu de vez qual era sua vocação. 

Por gostar tanto daquela arte de atuar, o ator logo buscou se especializar no assunto. Fez um curso de teatro na Funceb e depois outro no Sesc Casa do Comércio com Ramon Reverendo. Em Salvador, ele trabalhou com o diretor Manoel Lopes e integrou o grupo Psicodélicos. Mas ainda não estava perfeito, sabe? Tony amava atuar, já estava em um grupo, contudo, ser ator na Bahia é difícil, as oportunidades são escassas.

Assim, decidiu se mudar para São Paulo, onde está há 16 anos. Lá fez cursos e mais cursos: formação não faltava. Entre essas especializações, uma importante foi de interpretação para TV e Cinema. De fato Tony atuou em séries e filmes, mas a gente chega nisso daqui a pouco. Na capital paulista, Tony tinha um amigo também ator: Ricardo Bittencourt. Ele integrava o Teatro Oficina, uma das mais longevas companhias de teatro em atividade no Brasil. Ricardo, então, apresentou Tony a um dos mais renomados diretores de teatro do Brasil, José Celso Martinez Corrêa, o Zé Celso.

Zé Celso precisava de um ator para a peça shakespeariana Grande Otelo. Tony não pôde participar da produção, mas caiu nas graças do diretor. Celso o convidou para seu próximo espetáculo: “Macumba Antropófaga”, uma homenagem a Oswald de Andrade. Desde então, os dois formaram uma parceria que já dura onze anos. “Zé Celso é esse mestre, muito respeitado no teatro do Brasil todo. Ele sempre foi um homem revolucionário, que lutou muito pelo teatro e sempre foi favorável à inclusão”, destaca.

Conhecer um diretor disposto a dar oportunidade para a diversidade foi muito importante para a carreira de Tony. “A gente ver o protagonismo negro ganhando espaço agora nas novelas, mas quando eu comecei a realidade era bem diferente. Lá nos anos 90, por exemplo, nas novelas de Jorge Amado, os personagens que eram negros acabavam sendo modificados. Eles não eram interpretados por  negros”, reforça.

Para além do teatro, o ator também fez séries como “Som e Fúria”, dirigida pelo renomado Fernando Meirelles, indicado ao Oscar por Cidade de Deus. Na televisão, outras participações foram em “Irmãos Freitas”, “O negócio” e “Carcereiros”. Mas não só de tv e teatro vive Tony Reis, ele também fez uma ponta no clipe de “Amor de Que”, música hit da cantora Pabllo Vittar.

Integrando o Teatro Oficina, o artista também fez muitos trabalhos com outro diretor marcante em sua trajetória: Marcelo Drummond. Com Marcelo, Tony fez, por exemplo, a peça “O Assassinato do Anão do Caralho Grande”, com os personagens Sargento e Bicha Lili.

Nesses anos de Oficina, outra peça muito relevante foi Roda Viva, de Chico Buarque, sob direção de Zé Celso. Agora, o ator está em cena em nova (e última) direção de Celso, com o espetáculo “Fausto”. A peça é uma adaptação da obra de Christopher Marlowe, sendo uma Tragikomédiaorgia que trata da busca incessante pelo desejo de conhecimento. A “Entidade” Fausto, assim, baixa no Brasil e se transforma numa Peça Musicada de Teatro Brasileiro.

Na peça, Tony Reis interpreta mais de um personagem. Ele é Robin, o Duque Grande Otelo e um acadêmico da USP. Quando perguntado qual a mensagem que o espetáculo busca passar ao público, o ator destaca: “Estamos sempre afirmando que o teatro é muito importante. É um ato político ir ao teatro. Buscamos reforçar essa ideia do público ir e lotar as cadeiras, encher o espaço”. 

“Fausto” estreou em Belo Horizonte em maio com casa cheia e está em cartaz até domingo, 21, no Teatro Salesiano, em Salvador. Foi a primeira ação de teatro do CCBB Salvador na cidade. 

A chance de voltar a sua terra apresentando sua arte comove Tony. “Eu sou da comunidade Bonocô, minha família tinha dúvidas, era uma carreira muito incerta. Retornar a Salvador com essa mega produção é muito emocionante. Eu vi as lágrimas de minha irmã quando me viu em cena pela primeira vez”, completa.