Prefeitura de SP entrega centros LGBT+ a grupo católico, mas edital vetava organização religiosa; Gestão Nunes nega irregularidade

Genilson Coutinho,
14/11/2024 | 14h11

A Prefeitura de São Paulo lançou um edital em julho buscando organizações sociais para gerirem seus cinco Centros de Cidadania LGBTI+ até 2029. O documento proibia a participação de organizações religiosas, mas uma entidade católica foi uma das vencedoras da disputa.

O Instituto Claret, dos claretianos –congregação religiosa fundada por Santo Antônio Maria Claret– ficou com a gestão do Centro de Referência Luana Barbosa dos Reis, na zona norte, e com o Centro de Referência Claudia Wonder, na zona oeste.

A Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania diz que o Instituto Claret, conforme o seu estatuto, é pessoa jurídica de direito privado, na forma de associação, com objetivo filantrópico de educação, cultura, assistência social e esporte, sem fins lucrativos. Como tal, “ela está apta a participar do edital de chamamento público, uma vez que não se trata de organização dedicada exclusivamente a atividades ou projetos de fins religiosos”, afirma a pasta.

O Claret segue a mesma linha de argumentação. “Somos uma Organização da Sociedade Civil como qualquer outra, e ao longo de 38 anos de atuação, trabalhamos com parcerias públicas visando sempre o acolhimento, o cuidado e a inclusão de pessoas, sem distinção.”

Sobre os questionamentos levantados através da história do Instituto Claret ser atrelada aos Missionários Claretianos do Brasil, “estamos falando de razões sociais diferentes, que possuem finalidades e atuações distintas”, explica a entidade.

Especialistas ouvidos pela Folha, porém, dizem que ser uma Organização da Sociedade Civil não isenta o Claret de sua fundação religiosa. “Ela é uma associação religiosa. Toda sua diretoria é formada por padres”, diz Hédio Silva Junior, doutor em direito constitucional e fundador do JusRacial e do Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras.

Segundo ele, o sistema jurídico prevê três arquiteturas para entidade religiosa: fundação, organização e associação. “Não interesse se ela é fundação, organização ou associação, ela é uma instituição confessional”, diz Junior.

Há ainda outra questão. Conforme o documento da prefeitura, cada entidade poder gerir apenas um centro de cidadania, e o Instituto Claret venceu dois. Questionada sobre isso, a gestão Ricardo Nunes (MDB) respondeu que a organização foi notificada para apresentar desistência formal de um dos lotes.

As vencedoras do edital receberão mais de R$ 10 milhões cada para gerir os equipamentos por cinco anos.

Os Centros de Cidadania LGBTI+ da Prefeitura de São Paulo foram criados em 2015, no governo Fernando Haddd (PT), para o desenvolvimento de ações permanentes de combate à homotransfobia. Há um em cada região da cidade. Os equipamentos atuam a partir de dois eixos.

Primeiro, o atendimento a vítimas de violência, preconceito e discriminação, com prestação de apoio jurídico, psicológico e de serviço social, com acompanhamento para realização de boletins de ocorrência e demais orientações.

Segundo, a promoção da cidadania, dando suporte e apoio aos serviços públicos e realizando mediação de conflitos, debates, palestras e seminários. Além das sedes fixas, cinco Unidades Móveis de Cidadania LGBTI+ percorrem a cidade.

Fonte: Folha de S. Paulo