Nome social: um respeito à identidade de gênero
Um estudo publicado no Journal of Adolescent Health revelou que o uso consistente do nome social entre jovens adultos transgêneros parece reduzir de forma expressiva sintomas depressivos, bem como ideação e comportamento suicida, reforçando como o simples ato de chamar alguém pelo nome de sua escolha pode ser determinante para sua saúde mental e bem-estar. “O desrespeito ao nome social invalida a identidade da pessoa e prejudica profundamente a relação médico-paciente. É uma barreira que afasta pessoas trans dos serviços de saúde, gerando desfechos clínicos piores”, afirma Caio Portela, médico de Família e Comunidade e professor de Saúde da População LGBTQIA+ e Saúde da População Negra na pós-graduação do Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês. “Por outro lado, medidas simples, como formulários com campo de nome social e treinamento da equipe, transformam a experiência do paciente e aumentam a confiança no sistema de saúde.”
No Brasil, o uso do nome social é um direito garantido por instrumentos legais como o Decreto nº 8.727/2016 e a Portaria nº 1.820/2009 do Ministério da Saúde., Em 2024, o Supremo Tribunal Federal reforçou esse direito ao determinar que o Sistema Único de Saúde (SUS) deve assegurar o atendimento integral a pessoas trans, incluindo cuidados relacionados ao sexo biológico, garantindo respeito à identidade de gênero e ampliando o acesso sem discriminação.
Alessa Veneno, assistente administrativa do Hospital Sírio-Libanês, conta como a inclusão foi essencial na sua trajetória. “Sou uma mulher trans do interior do Paraná. Comecei minha transição em 2021. Quando iniciei a terapia hormonal no posto de saúde, fui muito bem tratada. Me orientaram a incluir o nome social na carteirinha, e, quando o escolhi, foi muito simples o processo. Isso me deu força para seguir em frente nessa constante batalha que é existir sendo uma pessoa trans”, relata.
Segundo ela, ser chamada pelo nome social vai muito além do conforto. “É um dos primeiros passos no processo de aceitação. Quando esse nome é respeitado, a gente sente que é possível existir com dignidade, mesmo com todos os desafios. Isso melhora nossa saúde mental porque sentimos que nossa existência importa.” Em um dos poucos momentos em que seu nome social foi desrespeitado, Alessa conta o impacto que sentiu. “Uma vez, em um exame externo, recebi o laudo com meu nome morto. Foi um baque. É como se, por alguns instantes, tudo o que conquistei tivesse sido apagado. Por isso, a importância da inclusão. Essas mudanças não são apenas burocráticas. Elas demonstram que, ao menos ali, uma instituição se importa com a gente. Isso nos traz alívio e acolhimento, e torna o processo da transição menos árduo”, finaliza Alessa.
Desde 2024, o Hospital Sírio-Libanês tem implementado iniciativas para tornar o atendimento mais inclusivo e respeitoso às individualidades. Entre essas iniciativas, destacam-se frentes de trabalho e educação em diversidade e inclusão, a criação do núcleo de cuidados em saúde para pessoas trans “Larissa Giannoccaro Linares” e a revisão de processos e sistemas. Para assegurar a inclusão do nome social, o hospital está realizando integrações de cadastro, garantindo o aparecimento deste identificador em pulseiras e em demais interfaces. Além disso, a instituição está capacitando suas equipes para ampliar a visão sobre a diversidade e reforçar o respeito como base nas relações humanas, sendo um compromisso institucional promover um ambiente livre de agressões.
Para Caio Portela, a capacitação contínua dos profissionais é essencial. “Tratar os pacientes com respeito à sua identidade, não errar pronomes e, em caso de dúvida, perguntar com educação são atitudes básicas que fazem toda a diferença. O acolhimento não exige grandes recursos, mas, sim, empatia. O respeito ao nome social salva vidas. Quando um paciente se sente reconhecido e respeitado, ele continua vindo ao hospital, faz os exames, segue o tratamento. Isso é saúde de verdade”, completa.