Grupo de Trabalho criado no Ministério dos Direitos Humanos vai esclarecer violências LGBTfóbicas na história do país
Renan Quinalha, professor de Direito da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) foi escolhido pelo ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio de Almeida, para coordenar o Grupo de Trabalho criado especialmente para esclarecer as violações contra as pessoas LGBTQIA+ na história brasileira. O grupo, que é composto também por outros representantes da sociedade civil e de órgãos públicos, atuará com o objetivo de garantir e efetivar os direitos à memória e à verdade histórica, bem como à dignidade desse público.
O docente da Unifesp recebeu o convite da Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, com quem já mantinha diálogo. Quinalha participou da Comissão Nacional da Verdade e nesse âmbito se dedicava à inclusão do capítulo sobre a diversidade sexual de gênero na ditadura.
“Foi justamente nessas conversas que tivemos a ideia de constituir um Grupo de Trabalho de maneira mais ampla, envolvendo toda a história brasileira, desde a colonização, de forma a entender os padrões de violação dos direitos das pessoas LGBTQIA+ da nossa história, com o objetivo de sistematizar, registrar e oficializar, além de sugerir e recomendar políticas públicas de direitos humanos para reparação dessas violências. Muitas dessas violências são estruturais e, portanto, persistentes e com padrões contínuos, ou seja, culturais, institucionais e que permanecem quase que inalteradas em todos esses anos de Brasil”, destaca Quinalha.
Além da liderança do Grupo de Trabalho, Quinalha reforça a participação da Unifesp nessa iniciativa junto ao Ministério dos Direitos Humanos com o seu Núcleo Trans, com quem será firmado um convênio para a contratação de bolsistas que irão colaborar em todo o processo.
“Trata-se de um trabalho em nível nacional e para executá-lo, já estamos levantando recursos que viabilizem essas contratações. Queremos e precisamos de todo conhecimento e de tudo o que a universidade pode prover também com a sua legitimidade, para podermos fazer um trabalho mais consistente e efetivo, e que cumpra a sua função numa perspectiva de extensão, de diálogo com a comunidade, de construção das políticas públicas, de direitos humanos, e também cumprindo a nossa vocação de uma universidade socialmente referenciada, do qual temos muito orgulho”.
Construção da história com diversas fontes
Para levantar, registrar e sistematizar as violações históricas às pessoas LGBTQIA+, o GT fará uso de fontes documentais de estado, além de outros tipos de acervos e depoimentos de ativistas que participam do movimento, desde as suas primeiras gerações. “Também pretendemos realizar audiências públicas para ouvir especialistas e aqui incluímos o papel fundamental das universidades, já que há muitas pessoas fazendo pesquisas nesse campo da historiografia em todo o país, da cidadania dessa população LGBTQIA+. Todo o material vai nos auxiliar a traçar um amplo cenário sobre como essas violências, esses padrões de violações aconteceram”, explica Quinalha.
Além da construção da memória, o Grupo de Trabalho criará uma categorização para essas violações contra a população LGBTQIA+ e trabalhará em cinco eixos: direito à verdade, direito à memória, direito à reparação, direito à justiça, e reforma das instituições. Os eixos ajudarão o grupo a não apenas aprofundar a compreensão sobre o tema, como também sugerir políticas de direitos humanos e recomendar soluções que vão dizer respeito tanto ao ministério dos Direitos Humanos quanto outras pastas do governo, isso nas três esferas: federal, estadual e municipal, “de modo a enfrentar a violência LGBTfóbica e preveni-la verdadeiramente”.
A portaria que estabelece o Grupo de Trabalho foi divulgada no Diário Oficial da União no dia 16 de maio de 2023 e atribui a ele algumas competências, como assessorar o Ministério de Direitos Humanos e da Cidadania nas questões referentes às violações cometidas contra as pessoas LGBTQIA+; recuperar e dar continuidade, no que couber, as recomendações finais do relatório final elaborado pela Comissão da Verdade, instituída pela Lei nº 12.528/2011; realizar estudos e discutir estratégias para o resgate da memória e esclarecimento da verdade histórica sobre crimes e perseguições contra as pessoas LGBTQIA+; propor relatório documental que sistematize fatos e acontecimentos históricos relativos à memória e à verdade das pessoas LGBTQIA+, em suas interseccionalidades; e propor políticas públicas de direitos humanos voltadas para promoção e efetivação dos direitos à memória e à verdade das pessoas LGBTQIA+, como elaboração e manutenção de novos e dos já existentes projetos de museus e acervos públicos de documentação histórica, bibliotecas e centros culturais sobre as histórias das pessoas LGBTQIA+, de seus movimentos sociais e populares organizados, e das violências institucionalizadas de que essas pessoas foram vítimas desde o Brasil Colônia.