Dia Internacional da Luta Contra a LGBTQIAP+fobia: Especialista fala da importância de um olhar especializado para a saúde sexual trans
Em 17 de maio de 1990, uma decisão histórica da Organização Mundial da Saúde (OMS) marcou um avanço significativo na luta pelos direitos do movimento LGBTQIAP+. Neste contexto, a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO) convida à reflexão sobre a vital importância da integralidade da saúde da pessoa trans, destacando particularmente a esfera da sexualidade.
O Dr. Eduardo Siqueira, membro da Comissão de Sexologia da FEBRASGO, destaca a atenção sobre as recomendações ginecológicas para as mulheres trans. Além de oferecer suporte no processo de hormonização, é importante ressaltar que mulheres trans, travestis e pessoas trans femininas podem precisar de avaliações ginecológicas regulares. Mas caso essas mulheres estejam por cinco ou mais anos em hormonização, elas devem ser rastreadas para neoplasias mamárias, após os 40 ou 50 anos (a depender dos diferentes protocolos de rastreamentos), conforme estabelecido para as mulheres cis. “Estamos acostumados a dizer que o ginecologista é o “clínico da mulher”. Portanto, devemos desempenhar esse papel, independentemente da identidade de gênero – cis ou trans – da paciente”, comenta o especialista.
Sobre procedimentos comuns, o médico reforça que mulheres trans não possuem colo do útero e, portanto, não precisam realizar o exame de Papanicolau. No entanto, se essas mulheres estiverem em processo de hormonização por cinco anos ou mais, devem ser rastreadas para neoplasias mamárias a partir dos 40 ou 50 anos (dependendo dos diferentes protocolos de rastreamento), conforme estabelecido para as mulheres cis. “Em resumo, o ginecologista é um profissional importante para apoiar mulheres trans e pessoas trans femininas durante o processo de transição de gênero”, explicou o médico.
Contracepção e Planejamento familiar
As mulheres transgênero são aquelas que, ao nascer, têm genitália masculina (pênis e testículos). Mesmo durante a hormonização, elas continuam a produzir espermatozóides e, portanto, mantêm a capacidade de fertilidade. Os hormônios utilizados durante a transição de gênero não funcionam como contraceptivos. Isso significa que, se uma mulher transgênero tiver relações sexuais com alguém que tenha vagina e útero, essa pessoa poderá engravidar normalmente. Portanto, é sempre importante utilizar métodos contraceptivos quando o desejo for evitar uma gravidez.
Saúde Reprodutiva
O principal ponto é o acesso a informações de qualidade e a serviços de saúde adequados para pessoas trans. Existem algumas particularidades que devem ser consideradas durante a assistência e a oferta desses serviços, e os profissionais de saúde devem estar capacitados para fornecer essas informações à população trans.
Prevenção de Infecções Sexualmente transmissíveis
O Dr. Eduardo Siqueira explica que a prevenção de infecções sexualmente transmissíveis para mulheres trans segue o mesmo raciocínio das medidas orientadas para a população cis. O que talvez diferencie é um acesso maior a essas medidas para as populações cis. “Hoje, trabalhamos com o conceito de prevenção combinada às IST, e como podemos perceber, embora seja um conceito novo, a prática já é conhecida. Estamos falando do uso de preservativos associados a lubrificantes durante as relações sexuais”, explica o ginecologista.
Nas situações em que houve falha dessas medidas iniciais, é indicado o uso da PEP, ou seja, medicamentos usados após a relação sexual, para evitar a infecção pelo HIV. Outras medidas medicamentosas também existem para complementar essas prevenções. “E, claro, não podemos esquecer de reforçar a necessidade de manter a vacinação em dia: hepatites A e B e HPV, por exemplo, são vacinas que devem ser sempre lembradas como medidas preventivas de IST”, completa.
Profissionais da Saúde no acolhimento, no cuidado e na atenção à saúde
“Hoje, as demandas da população trans estão extremamente negligenciadas, seja pela falta de serviços estruturados que os acolham, seja pela falta de engajamento dos próprios profissionais de saúde nessa assistência. O cuidado com as pessoas trans apresenta suas particularidades, porém está dentro das capacidades dos profissionais de saúde. Podemos não ser especialistas em hormonização, mas somos capazes de realizar exames clínicos e preventivos e fornecer informações sobre riscos à saúde. Temos um papel fundamental, especialmente porque lidamos com uma população vulnerável que tem acesso limitado aos serviços de saúde, e não podemos nem devemos fugir dessa responsabilidade”, finaliza o médico.
Noções de diversidade
A FEBRASGO demonstra seu compromisso com a diversidade por meio de diversas iniciativas, incluindo a realização de painéis em eventos que abordam essa temática e promovem uma compreensão mais ampla da diversidade para os ginecologistas. Um exemplo disso foi a apresentação do Dr. Luiz Brito durante a 29ª Jornada Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, na qual ele discutiu os desafios enfrentados pela mulher trans.
O Brasil é o país que mais registra casos de homicídio de pessoas transgênero no mundo, e a violência contra essa comunidade é alarmantemente alta. Dessa forma, uma grande parcela da população, cerca de 80% em geral, nunca teve contato ou conhecimento de alguém trans. “Esse desconhecimento acarreta em falta de habilidade e sensibilidade no trato com essa população, uma situação que não é abordada na maioria das escolas de medicina. Por isso, é essencial introduzir aulas que ofereçam noções de diversidade aos médicos ginecologistas sobre esse tema. Durante essas aulas, abordamos questões como como realizar um atendimento adequado, como se referir à pessoa de maneira respeitosa, como é a experiência de vida de uma pessoa trans, incluindo o momento em que ela passa a viver de acordo com o gênero com o qual se identifica, entre outros aspectos”, frisou o Dr. Luiz.