Reconhecida como constitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a união entre pessoas do mesmo sexo está a caminho de ser oficialmente incorporada à legislação brasileira. De acordo com o texto, que está em análise no Senado, a alteração garante maior segurança jurídica à população LGBTQIAPN+. Atualização representa avanço neste dia do Orgulho, 28 de junho, data alusiva ao respeito a essa comunidade, incentivando o combate a todas as formas de preconceito e discriminação. Luciana Musse, professora de Direito de Família do Centro Universitário de Brasília (CEUB) e advogada especialista em Direito de Família e Sucessões, defende atualização proposta e a efetivação da garantia dos direitos dos casais homoafetivos. Segundo ela, os avanços não se limitarão aos institutos jurídicos, com impactos positivos na percepção da população LGBTQIAPN+ de maneira geral. Confira entrevista, na íntegra:Qual é o impacto da atualização do Código Civil na legalização da união homoafetiva no Brasil?LM: O impacto da legalização do casamento homoafetivo proposta pela comissão de juristas, se aprovada pelo legislativo, é a maior segurança jurídica para os casais, pois, no Brasil, a lei é a fonte mais importante do Direito e deve prevalecer em relação a outras fontes como a jurisprudência ou a doutrina. Como a decisão unânime do STF equiparando as relações entre pessoas do mesmo sexo às uniões estáveis entre homens e mulheres influencia a interpretação do Código Civil?LM: A decisão influencia a interpretação das normas cíveis e registrais relacionadas ao casamento e à união estável, que deverão ser feitos conforme a Constituição. Apesar de a redação atual do Código Civil e da própria Constituição Federal mencionar “homem e mulher”, o intérprete (como um tabelião ou juiz) deve entender essa expressão como “entre duas pessoas” para não violar os princípios constitucionais da dignidade humana e da igualdade, evitando, assim, a discriminação. De que outras formas a atualização do Código Civil pode influenciar as relações contratuais e o direito sucessório no Brasil?LM: O reconhecimento legal do modelo de família homoafetiva, quer pelo casamento, quer pela união estável, tem desdobramentos em outros institutos, como a obrigação alimentar, inclusive ao pagamento de alimentos compensatórios. Assim entendido como o valor a ser pago ao “cônjuge ou convivente cuja dissolução do casamento ou da união estável produza um desequilíbrio econômico que importe em uma queda brusca do padrão de vida”. Se aprovado, terá impacto em outros campos do direito, como o direito sucessório, que disciplina a herança e o testamento, por exemplo. Como a Resolução 175/2013 do CNJ contribuiu para garantir os direitos das uniões homoafetivas no país?LM: A Resolução n. 175/2013 reforça e reafirma o direito fundamental à formação, à formalização e ao reconhecimento da família homoafetiva, por intermédio do casamento quando veda a recusa de habilitação e celebração do casamento, ou à conversão de união estável em casamento entre pessoas do mesmo sexo. Além de prever a comunicação dessa recusa ao juiz corregedor, para providências. Considerando a atual configuração do Senado, quais desafios são esperados na aprovação das mudanças propostas nesse anteprojeto?LM: Desde o início dos trabalhos da comissão de juristas, foram disseminadas fake news em torno desta e de outras temáticas, como a legalização do aborto. Como o campo da política é muito sensível à opinião pública, pode haver maior resistência à aprovação desses dispositivos legais voltados à proteção das famílias homoafetivas. Além da dimensão legal, de que forma a mudança no Código Civil pode impactar a percepção social e cultural das uniões homoafetivas no Brasil?LM: O direito, como um fenômeno social, tanto influencia quanto é influenciado pela sociedade, em uma relação dialética. Nesse contexto, as mudanças aprovadas em relação ao casamento e à união homoafetiva irão moldar o comportamento da população e das autoridades, impulsionando, ampliando e até acelerando modificações culturais. Cabe destacar que transformações não se limitarão aos institutos jurídicos, mas afetarão a percepção e os direitos da população LGBTQIAPN+. |