Brasil lidera o ranking dos países que mais matam LGBTIs+. De acordo com levantamento do Grupo Gay da Bahia (GGB), ao menos 256 lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transgêneros foram vítimas de morte violenta em 2022. A partir da análise do noticiário, foram apontados 242 homicídios e 14 suicídios ao longo do ano passado, ou seja, uma morte a cada 34 horas. São pessoas que sofrem diariamente com o preconceito, exclusão, violação de seus direitos e dificuldade de acesso à educação e ao mercado de trabalho.
Na contramão desta realidade e com o objetivo de reduzir danos, o terapeuta integrativo e educador em sexualidade consciente e tantra, Marcelo Galaktico, criou o projeto Afeto, que acolhe homens gays e bissexuais a partir de interações que promovem a auto aceitação, o auto conhecimento, amor próprio, sexo seguro e a arte.
“Abraçamos o afeto como força que dá vida ao nosso dia a dia. Cada gesto, cada expressão de ternura são pedacinhos da nossa humanidade compartilhada. O toque suave e o olhar compassivo são os fios que criam a rede que nos conecta a todos”, explica.
Marcelo conta que o projeto surgiu em 2019 e foi criado por causa de sua dor de não conseguir espaço seguro e saudável para compartilhar os processos de aceitação da sexualidade. “Foi uma forma de reunir os homens para podermos partilhar e falar dos nossos sentimentos. A proposta era criar um grupo para partilharmos nossas experiências e inquietações. No início era uma página para desabafo, mas começaram a chegar homens interessados em participar.”
A página já não era o suficiente para o projeto e nos anos de pandemia foram feitos encontros à distância com homens de diversos estados e de alguns países. “Quando fomos para o digital, o projeto teve uma expansão, não só para São Paulo, mas para todo o Brasil e alguns países. Tive a oportunidade de escutar histórias de mais de dois mil homens.”
Retiros
Depois da pandemia, Marcelo teve a ideia de fazer pequenos retiros para acolher esses homens e ter uma imersão no autoconhecimento, auto amor e no sexo seguro. Esses encontros, com o nome de “Mastersoul Extended”, acontecem durante três dias em um Refúgio das Montanhas chamada Yogui House, na cidade de Atibaia.
“O retiro é realizado em um final de semana, temos uma jornada sensorial de autoconhecimento, amor próprio e pertencimento, indo para um lugar rodeado de montanhas, onde as práticas são potencializadas por estarmos próximos da natureza. Ficamos ali juntos, em uma casa e todos estão cientes dos motivos que os levaram até o retiro”, explica.
Todos os retiros ocorrem de forma totalmente gratuita e visa acolher todos os homens que sentem vontade de participar. No entanto, Marcelo esclarece que, para o projeto se manter de pé, é preciso que os participantes que puderem ajudar, doem um valor significativo de colaboração.
Para dar oportunidade a homens bissexuais e homossexuais de baixa renda ou em vulnerabilidade, Marcelo criou bolsas para os retiros com tudo incluso. “Criei sistemas de bolsas chamado ‘Programa Semear’, com valor de R$1.800 com tudo incluso. Desta forma, consigo trazer pessoas com instabilidade financeira.”
Segundo Marcelo, muitos dos homens que o procuram, têm problemas em relação ao afeto, não conseguem viver a sexualidade de forma livre e não conseguem se aceitar como são. “Recebo homens com deficiência visual, indígenas, pretos, de terceira idade que se assumiram para a família, pessoas que ainda não se assumiram. É um aprendizado em conjunto para cada um deles, para curar seus interiores e fazer com que eles saiam do retiro sabendo quem são, livres de qualquer coisa que os prendia.”
Marcelo afirma que sempre muda o tema dos retiros, trazendo profissionais que explicam e aplicam os temas para o público de forma clara. “Sempre trago terapeutas, profissionais que trabalham com autoconhecimento, sexualidade e consentimento, porque cada retiro é diferente e acaba tendo sempre novidades. Como a cada retiro aparecem pessoas diferentes, cada reunião se difere das outras.”
“A imersão levanta bastante substrato e a pessoa tem que continuar com tratamentos terapêuticos para que melhore a cada dia mais, porque existem problemas que precisam ter continuidade nos tratamentos”, afirma.
Planos para o futuro
O idealizador do Afeto revela que até este momento foram realizados quatro retiros e tem mais um marcado para dezembro de 2023. Seu plano para o futuro é levar os encontros em formato menor para outras cidades. “Em vez de três dias, em outras cidades pelo Brasil será apenas um dia inteiro, como uma forma de divulgação do trabalho. Ano que vem pretendo fazer quatro encontros de três dias e 5 workshops.”
Futuramente Marcelo quer fazer um festival de autoconhecimento e também trabalhar com o público juvenil da comunidade. “Meu sonho é reunir um grupo de 100, 200 homens e ficarmos 5 dias aprofundados nas práticas de conhecimento, sexualidade consciente e espiritualidade. Meu outro sonho é levar o projeto para escolas e falar sobre o processo do bullying, abuso sexual e de não aceitação. Quero trazer tudo em uma linguagem acessível para acolher o público mais jovem que está começando agora a vida”, finalizou