Na última quarta-feira (21), a gigante da indústria farmacêutica Bayer convidou médicos, ativistas e imprensa para um encontro em São Paulo, com o objetivo de realizar uma roda de conversa que teve como foco os métodos contraceptivos mais modernos e suas contribuições para um planejamento familiar mais eficaz. A ação integrou a programação dedicada ao Dia Mundial da Contracepção, celebrado no dia 26 de setembro, que mobiliza empresas e a sociedade em torno do assunto.
Este ano, a Bayer escolheu abordar o tema “Saúde reprodutiva: soluções e estratégias contraceptivas na adolescência e na comunidade LGBTQIAPN+”, um tema de grande relevância considerando a recorrente falta de diálogo entre a juventude e seus familiares, especialmente quando se trata de jovens da comunidade LGBTQIAPN+.
A abertura do encontro foi realizada por Elke Mittelsdorf, líder da área de Saúde Feminina da Bayer no Brasil, que ressaltou que os jovens da comunidade LGBTQIAP+ são geralmente invisibilizados quando o assunto é gravidez. “Essas questões são presentes na Bayer, e a gente trabalha por elas não apenas no dia mundial, mas em todos os dias, e isso é maravilhoso. Sabermos que aqui podemos ser quem somos, isso é muito bom. Ao longo dos dez anos que estou aqui, tenho visto muitos crescimentos e compromisso em oferecer sempre o melhor e, juntos com nossos grupos de afinidades, que são voluntários, temos um trabalho muito importante de identificar essas necessidades para buscamos as soluções em conjunto. E essa liberdade é motivo de muito orgulho para todos”, pontuou.
Para abordar o assunto, a Bayer promoveu uma roda de conversa com o médico hebiatra Benito Lourenço – chefe da Unidade de Adolescentes do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC/FMUSP) –, Roberto Bete – pai do pequeno Noah, fruto de seu relacionamento com Erika Fernandes, uma mulher trans –, Dr. Edson Ferreira e a colaboradora da Bayer, Kevanny Silva – que teve sua primeira gravidez na adolescência.
O hebiatra Benito Lourenço apresentou um panorama da vida dos adolescentes brasileiros e seus principais medos e traumas, levantando a bola da importância do diálogo em família, sempre buscando contextualizar com a realidade do adolescente, que já traz uma carga de muitos “nãos”, principalmente quando o assunto é gravidez na adolescência. “Tudo ainda é muito tabu, e não precisamos ficar dizendo que a adolescentes não devem engravidar. Precisamos dizer o porquê e as consequências que uma gravidez mal planejada poderá trazer para a vida de um(a) jovem. Mas infelizmente no Brasil é sempre assim, o não vem na frente”.
Outro ponto que Benito usou como exemplo de negativas geralmente mal explicadas é sobre o uso de camisinha. “Podemos citar, por exemplo, as desculpas que escutamos quando o jovem usa a camisinha na sua primeira relação e a ereção vai embora, e ele já diz que não vai usar mais, pois não consegue manter a ereção. Como resolvemos isso? Temos que explicar que acontece, e que existem outras maneiras de ter prazer, e que chega um momento que a camisinha estará na vida desse jovem. Não é um trabalho fácil, mas precisamos ser didáticos”, afirma. O médico hebiatra complementou com um dado interessante: o preservativo interno feminino é mais usado pelas mulheres na comunidade LGBTQIAPN+. “Por que isso? Porque a mulher não foi apresentada a esse método da mesma forma que os meninos foram”, explica.
O encontro também foi marcado pela emoção de Roberto, homem trans que apresentou um relato sobre o processo de realizar o sonho de ser pai e como isso mudou sua vida. “Eu sempre tive o sonho de ter um filho, e isso se fortaleceu quando comecei a integrar ainda mais a comunidade LGBTQIAPN+, que me deu muita força para seguir com esse sonho. E foi aí que conheci a Érica, e que tomamos a decisão. E isso me fez enxergar que eu tinha um útero, e que eu podia realizar esse sonho.
Eu ainda me questionei: será que é o momento? Mas pensei também: se eu não fizer isso agora, será que terei outra oportunidade? Daí procuramos o médico, que recomendou a suspensão do hormônio, e iniciamos os tratamentos. E ele nos alertou que poderia acontecer a qualquer momento, pois não tinha como determinar o tempo exato. E o tempo foi passando, e quando voltamos para fazer os exames, o Noah já estava dentro de mim”.
Emocionado, Roberto detalhou os momentos que se seguiram ao longo da gestação. “Vocês não imaginam quantas emoções tomaram conta de mim, e isso foi motivo de muita alegria, a descoberta da vinda do meu primeiro filho. E se você me perguntar se passaria tudo outra vez…sem dúvidas faria tudo de novo. Não posso deixar de agradecer ao SUS por todo apoio, da descoberta ao nascimento. Hoje, sou devoto do SUS e grato. Ser pai é algo que não tem explicação. Sou muito feliz com a minha família”.
O depoimento de Roberto mostra a importância do SUS no seu atendimento, mas levanta a questão de que muitas pessoas trans e travestis ainda sofrem em razão da falta de um atendimento humanizado nos serviços púbicos. Segundo o Dr. Edson Ferreira, há um processo de mudança em curso, ainda que pequeno, principalmente com a inclusão destes temas na matriz curricular dos cursos de saúde. “Hoje sinto que há uma mudança, principalmente com a inclusão e o debate de temas voltados para saúde da comunidade LGBTQIAPN+, e isso é fundamental, pois quando eu comecei, não existia nenhum tipo de discussão. Certa vez me debati com uma senhora que vivia com HIV e eu não sabia como lidar com aquela situação. Mas, hoje, noto essa mudança, mesmo sabendo que ainda é pouco, mas iniciamos, o que já é um bom começo para a inclusão e humanização do atendimento à comunidade”.
Foi nesse tom de mudança que a colaboradora da Bayer Kevanny apresentou seu relato de como deu uma guinada na vida após descobrir uma gravidez ainda na adolescência. Com dificuldades para lidar com a família, ela conta que chegou a se questionar se realmente queria viver aquela realidade, a partir do que observava de outras meninas da comunidade que já tinham filhos. “A gravidez mudou a minha vida, e sei que passei por muitas coisas para hoje estar aqui, contando com essa tranquilidade o que passei. Mas não desanimei, mesmo diante de tudo, engravidar mudou a minha vida e o modo de ver o mundo. Hoje sou outra pessoa, e continuo dentro da Bayer, deste o início da minha vida profissional, e esse apoio me ajudou muito. Se você me perguntar se quero ter outro filho, digo que no momento não, mas se fosse ter, com certeza seria planejado”, conta.
A importância de histórias como essas mostra o valor de encontros assim. Que a iniciativa da Bayer sirva para que mais empresas que trazem no seu DNA o respeito e a contribuição com o desenvolvimento social possam exercer cada vez mais esse papel tão importante para a evolução da sociedade como um todo.