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Disciplina e autocuidado: como a musculação ajudou Jadilson Neto a ressignificar o HIV

Genilson Coutinho,
05/09/2025 | 12h09

Viver com HIV ainda significa enfrentar preconceitos e barreiras — não apenas no acesso à saúde, mas também na forma como o corpo é percebido. Para muitas pessoas, o autocuidado se torna um ato de resistência e afirmação.

É nessa linha que a história de Jadilson Neto, enfermeiro da Estratégia Saúde da Família em Passo do Lumiar (MA), ganha força. Diagnosticado há mais de duas décadas, ele encontrou na musculação não só um aliado para a saúde física, mas também um símbolo de autoestima e protagonismo — algo que hoje faz questão de compartilhar para inspirar outras pessoas.

O caminho não foi simples, Jadilson conta: “Minha história é como qualquer outra: diagnóstico tardio, preconceito… A minha exposição no ambiente da faculdade também foi muito forte.”

Musculação como reencontro

Entre o peso do diagnóstico e o desejo de seguir em frente, Jadilson encontrou na musculação uma forma de se reinventar. Para ele, o treino se tornou um símbolo de recomeço:

“A musculação entrou depois do diagnóstico. Foi uma forma de reencontrar meu corpo, recuperar a autoestima e entender que saúde vai muito além de um exame.”

Mais do que os ganhos físicos, é a rotina disciplinada que prende Jadilson à musculação:

“A disciplina me fez me apaixonar pela musculação. Mostrou que, com consistência e dedicação, os resultados aparecem não só no corpo, mas também na mente.”

Segundo o educador físico do Instituto Vida Nova, José Ferreira Sodré, consultado pela Agência Aids, essa experiência não é isolada:

“A prática ajuda a melhorar a força muscular, aumentar a densidade óssea e favorecer a saúde cardiovascular, além de diminuir a sarcopénia — perda de massa muscular —, comum entre pessoas vivendo com HIV.”, afirma.

O HIV também mudou a forma como Jadilson enxerga o próprio corpo:

“Hoje eu sei que o autocuidado não é luxo, é sobrevivência. É sobre respeitar meu corpo, ouvir meus limites e valorizar a vida.”

O que diz a medicina?

Em contato com a Agência Aids, o infectologista Dr. Mateus Ettori, do Centro de Referência e Treinamento Aids de São Paulo, explicou que:

“Realizar regularmente exercícios físicos traz benefícios imensos. Para pessoas que vivem com HIV, do ponto de vista físico, ajuda a preservar a massa muscular, reduzir a inflamação e melhorar a saúde cardiovascular — fatores especialmente importantes porque o próprio vírus pode impactar esses sistemas.

O médico infectologista Mateus Ettori Cardoso | Foto: Reprodução

Do ponto de vista mental, o treino contribui para a redução de sintomas de ansiedade e depressão, além de fortalecer a autoestima e a sensação de autocontrole sobre a própria saúde. O corpo em movimento vai muito além dos ganhos físicos: simboliza cuidado, disciplina e, sobretudo, liberdade. Cada treino é um lembrete de que é possível transformar medo em coragem e estigma em autoestima.

Ou seja, viver com HIV não é limitação, é possibilidade — o autocuidado abre caminhos para saúde e futuro.”

Força contra o estigma

“Mostrar que uma pessoa vivendo com HIV pode ter saúde, força e qualidade de vida é quebrar estigmas todos os dias.”

Os ganhos foram nítidos: “No físico: mais energia, resistência e disposição. No mental: menos ansiedade, mais autoestima e confiança.”

Além dos efeitos visíveis, o exercício tem impacto profundo, explica o educador físico: “O exercício físico regular reduz o estresse, libera hormônios que melhoram o humor e aumenta a autoestima. Treinar é um ato de autocuidado, disciplina e resiliência, mas também uma forma de empoderamento que contribui para quebrar estigmas.”

Treino acompanhado e ambientes de inclusão

Hoje, Jadilson treina com personal três vezes por semana. “É fundamental. O personal direciona, corrige, me motiva e me ajuda a evoluir com segurança. É um investimento em saúde.”

Sobre o ambiente das academias, ele reconhece nuances: “Podem ser os dois. Infelizmente, já vi olhares de julgamento, mas também encontrei acolhimento. Eu escolho transformar a academia em espaço de inclusão e inspiração.”

Quando o preconceito aparece, ele reage com maturidade: “Já vivi, em comentários velados. Mas hoje, transformo isso em educação e conscientização.”

Jadilson e sua médica, Petra Samantha. Ele diz que “é importante termos laços com os profissionais.” | Foto: Acervo Pessoal

Motivação e conselho

“Saber de onde eu vim, os desafios que enfrentei, e a certeza de que cada treino é uma vitória contra o estigma e a favor da vida.”

Para quem teme começar por medo do estigma, Jadilson deixa um recado: “Não espere a aprovação de ninguém. Seu corpo é sua história. Cada repetição é um ato de resistência e amor-próprio.”

Vinícius Monteiro (vinicius@agenciaaids.com.br)

Estagiário em Jornalismo na Agência Aids

Edição: Talita Martins

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Jadilson Neto

Instagram: jadilsonneto

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