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Iniciativa gratuita revitaliza espaços públicos e fortalece a identidade cultural do bairro Uruguai com a arte urbana

Genilson Coutinho,
27/06/2025 | 17h06
Croqui Luna Bastos

Em uma cidade onde os muros contam histórias de resistência e ancestralidade, Salvador reafirma seu protagonismo no cenário nacional da arte urbana. Após transformar o Curuzu, território sagrado do movimento negro baiano, o projeto “Tem Arte nas Ruas” agora desembarca no Uruguai, bairro histórico da Cidade Baixa que carrega em suas vielas a memória viva da industrialização soteropolitana e da luta por dignidade.

Salvador consolidou-se como um dos principais pólos de arte urbana do Brasil, com mais de 3.000 intervenções catalogadas pela Secretaria Municipal de Cultura e Turismo desde 2019. Segundo dados do Mapeamento da Arte Urbana de Salvador (MAUS), a capital baiana abriga hoje cerca de 470 artistas urbanos ativos, número que cresceu 35% nos últimos cinco anos.
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Croqui Sagaz e Pipino

O bairro do Uruguai, situado às margens da Baía de Todos os Santos e parte integrante da Península de Itapagipe, representa um microcosmo da história afro-brasileira. Originalmente um polo industrial que atraiu trabalhadores negros no pós-abolição, hoje o território enfrenta desafios socioeconômicos, mas mantém viva sua potência cultural. “A arte urbana em Salvador não é apenas estética, é política. É uma forma de ocupação territorial que reivindica o direito à cidade e celebra a identidade afro-baiana”, explica Salete Perroni, curadora do projeto e uma das maiores referências em arte periférica do país.

Intercâmbio cultural e economia criativa

O “Tem Arte nas Ruas” reunirá 10 artistas nesta etapa, entre baianos e talentos de outros estados brasileiros, para uma ocupação criativa sem precedentes no bairro. Entre os dias 3 e 11 de julho, dez muros e espaços públicos serão transformados em galerias a céu aberto, com lançamento oficial marcado para o dia 12, sábado. Dentre os espaços revitalizados, em parceria com Escritório Popular de Arquitetura Maré, está a renovação estrutural da Praça Santa Luzia, situada em frente à Escola Luiza Mahin, que representa um espaço de educação comprometido com a valorização da cultura afro-brasileira e a promoção da equidade racial.
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Croqui Yacunã

Formação e legado

Além da produção dos murais, o projeto vai oferecer nesta etapa 50 vagas para uma oficina de grafite em parceria com o Coletivo Artístico MUSAS –  Museu de Street Art Salvador. As atividades formativas representam um investimento no futuro da arte urbana soteropolitana, que já revelou talentos como Eder Muniz (Calasans Neto do grafite), artista com reconhecimento internacional e que também integra a iniciativa. 

O cenário atual da arte urbana em Salvador reflete uma transformação significativa na percepção pública. De acordo com pesquisa da Fundação Gregório de Mattos, 78% dos soteropolitanos reconhecem o grafite como manifestação cultural legítima, contra apenas 45% em 2010. Em uma cidade onde 82% da população se autodeclara negra (IBGE, 2022), a maior fora da África, iniciativas como o “Tem Arte nas Ruas” transcendem o aspecto estético para se tornarem instrumentos de afirmação identitária e cidadania cultural.

“Tem Arte nas Ruas” é apresentado pelo Ministério da Cultura, Nubank e Larco, através da Lei Federal de Incentivo à Cultura, com patrocínio do Nubank e Larco, realização da Maré Produções, Ministério da Cultura e Governo Federal – União e Reconstrução.