Sala VIP

Patrícia Ribeiro retoma carreira após seis anos na prisão

Carlos Leal,
06/03/2023 | 13h03

Olá, sou Carlos Leal, jornalista e escritor e bati um papo para a Sala Vip do site Dois Terços com a cantora transexual portuguesa Patrícia Ribeiro, que acaba de deixar a prisão após envolvimento em caso de extorsão a um empresário. Durante a conversa, falamos sobre os aprendizados na prisão, a importância do apoio familiar e principalmente sobre esse momento de retomada da carreira.

Foto: Divulgação

“É uma história que nos leva a várias reflexões, principalmente sobre a importância do apoio familiar”, diz o jornalista e escritor Carlos Leal sobre o bate papo com a cantora transexual portuguesa Patrícia Ribeiro para a coluna Sala Vip do site Dois Terços.

Formado em Jornalismo pela Universidade Tiradentes (UNIT), e com dois livros lançados, um deles, em parceria com a professora Dra. Marilda Santanna, Carlos Leal bateu um papo com a cantora transexual portuguesa Patrícia Ribeiro que começou sua carreira nos anos 90 no Grupo Jovens Cantores de Lisboa e na Banda Onda Choc. Dentre seus sucessos no Brasil estão O Amor e o Poder, Lotaria do Amor, Temporal de Amor e Boys- Meu príncipe encantado, esta, com direito a videoclipe gravado nas praias de Ipanema e no Arpoador, no Rio de Janeiro. Porém, no auge do sucesso, presença constante em programas de TV, músicas nas rádios, entrevistas em jornais e revistas, dois discos de ouro, shows, videoclipes com superproduções, vê sua vida mudar de uma hora para outra, o que a fez cumprir seis dos oito anos a que foi condenada pelo crime de extorsão, em Portugal.

Dois Terços: Patrícia, o que de fato aconteceu contigo para que viesse essa condenação a oito anos de reclusão, dos quais você cumpriu seis?
Patrícia Ribeiro: Isso aconteceu em novembro de 2016. Eu e mais uma pessoa que era meu namorado na época, fomos denunciados, julgados e condenados pelo crime de extorsão a um empresário que conheci em 2009. O valor da extorsão foi de aproximadamente 400 mil euros. A vítima era um empresário que conheci em 2009, quando eu era acompanhante e tiramos fotos íntimas. A partir daí, foram quatro anos que passei a cometer esse crime, a ameaçá-lo.
DT: Naquele momento, além de todo o sucesso que você fazia, o que deve ter causado discursões e muitos julgamentos, o que foi pior para você?
PR: Enfrentar a sociedade não foi fácil, afinal, eu estava no auge, uma artista de sucesso. Mas o pior mesmo foi o sofrimento dos meus familiares, principalmente minha avó. Amor da minha vida. Quando ela me visitava e eu a via, através de um vidro, indo embora, era uma dor que não sei nem definir.


DT: Ao falar sobre sua avó, você afirma que o apoio da família é fundamental em momentos como esses?
PR: Totalmente. O apoio familiar torna-se elemento fundamental para que você possa suportar uma mudança tão radical de vida. Além disso, tomei consciência que, caso isso não tivesse ocorrido, talvez meu destino tivesse sido pior. Então, esses seis anos de reclusão me ajudou muito a ser a pessoa que me tornei. Eu poderia, por exemplo, ter tornado esse crime um ciclo vicioso. Então, agradeço a Deus por tudo que aconteceu.
DT
: Você já era famosa. Como as demais detentas receberam você na prisão?
PR: No primeiro dia, já na primeira refeição, onde estamos todas juntas, foi um choque. As pessoas ficavam me olhando e eu acanhada, sem saber o que dizer. Depois acostumaram.
DT: Fez muitas amizades na prisão?
PR: Não muitas. Eu sempre fui uma pessoa reservada, mas ter alguém com quem compartilhar histórias, desabafar e até chorar, é necessário.
DT: Como foi para você o dia em que soube que sairia da prisão, após cumprir seis dos oito anos de sua condenação?
PR: Primeiro eu passei por uma audiência para que a justiça desse um parecer, se eu estava apta ou não a sair da prisão. Aguardei essa resposta ansiosa por dois meses e quando ela chegou, foi uma benção. Sempre acreditei em Deus e sabia que ele estava do meu lado.

DT: Como essa notícia chegou até você?
PR: Nesse dia eu amanheci inquieta, sabia que tinha algo para acontecer. Eu trabalhava na lavanderia da instituição e de repente uma colega me chama e diz que o comissário queria falar comigo. Fiquei em alvoroço. Quando ele disse “hoje é o dia da sua liberdade”, quase não acredito. Perguntei de imediato se poderia ligar e contar a minha avó, que ficou emocionada. A partir daí, chamei um taxi e fui embora, mas, de fato, só fui acreditar que era real quando saí da prisão e vi o mundo lá fora.
DT: E como foi enfrentar a vida fora da prisão?
PR: Me deparei com uma realidade totalmente diferente da que deixei, principalmente quando falamos em economia. Preços de alimentos e alugueis, por exemplo, me assustaram. Houve um aumento absurdo. Para se ter uma ideia, hoje alugar uma apartamento em Lisboa gira em torno de dez mil reais, ou dois mil euros. Um quarto pode chegar a 500 euros. Culturalmente, o mundo também mudou.
DT: Dentro da instituição conheceu meninas brasileiras em situação semelhante?
PR: Sim, conheci algumas brasileiras. Existe uma ilusão que vir para a Europa é o caminho mais fácil, que irá ganhar muito dinheiro, e não é. A Vida aqui não é fácil. Mundialmente falando, estamos em um momento muito complicado. Temos a guerra da Ucrânia, passamos por uma pandemia e tudo isso fragilizou nossa economia. Eu, que passei por essa fase, aconselho principalmente as brasileiras que pensem bem antes de tentar um recomeço de vida na Europa nesse momento, garanto que não está fácil. A luta e o preconceito são grandes.
DT: No seu repertório musical está O Amor e o Poder, uma versão de Cláudio Rabelo para a música, The power of love, de Jennifer Rush e sucesso na voz da da cantora Rosana em 1984. Já pensa e articular sua vinda ao Brasil?
PR: Lógico, já estou me articulando e em breve estarei por aí. Amo o Brasil, até já divulguei um vídeo em minhas redes sociais com essa informação.
DT: Em 2014 você lançou em Portugal sua autobiografia, intitulada Ontem Homem, Hoje Mulher, lançada no Brasil no ano seguinte. Pretende lançar um novo livro contando sua experiência nesses seis anos de reclusão?
PR: Nada certo ainda, mas é uma possibilidade, acho que pode ajudar muito a outras pessoas não passarem pelo que passei.

DT: Como está sendo essa vida nova, esse recomeço fora da prisão?
PR: Graças a Deus tenho recebido muito apoio. A imprensa, por exemplo, tem me apoiado muito, eu sempre fui uma pessoa bem relacionada com jornalistas. Errar é humano, todos nos sabemos disso. Essa página está sendo virada na minha vida.
Me considero uma referência, afinal, fui responsável por dar uma virada de chave nessa história de identidade de gênero. Sempre venci pelo talento e isso ninguém tira de mim. Ah! Sem esquecer que dessa vez, além de São Paulo e Rio e Janeiro, também quero ir à Bahia.