Além do entendimento de tribunais superiores, a comunidade LGBT+ precisa de leis e direitos assegurados
por William Callegaro
Atualmente, a comunidade LGBT+ é formada por mais de 20 milhões de brasileiros/brasileiras, cerca de 10% da população do país (dado que pode estar sub-representado). Contudo, quando buscamos por esta representativa no Congresso Nacional encontramos pouquíssimas referências de pessoas LGBTs nas cadeiras parlamentares, o que impacta diretamente na construção e asseguramento dos direitos destas pessoas na Constituição. Como podemos falar sobre legislação de fomento ao emprego e empreendedorismo para a comunidade quando nem os direitos básicos estão garantidos na lei brasileira?
O pioneiro PL 1151 de 1995, da deputada Marta Suplicy, que aborda união civil entre pessoas do mesmo sexo, foi um dos avanços conquistados ao longo de muitos anos. Assim como a resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2013, baseada na decisão da união estável da ADI 4277. Porém, estas conquistas não significaram o status de meras proposituras e a inclusão de pautas LGBTs no legislativo. Na verdade, o Supremo Tribunal Federal (STF), como guardião da Constituição Federal, precisou partir para este papel resolutivo afim de acompanhar uma série de evoluções sociais que não foram contempladas e ficaram à margem de políticas públicas.
Dessa forma, o STF assumiu um atípico papel de legislador dos direitos humanos da comunidade LGBT+ com a declaração do direito a união estável entre pessoas do mesmo sexo no ano de 2011, demarcando esse órgão como o principal garantidor de respostas aos objetivos dessa população. Um passo crucial numa sociedade conservadora, onde as evoluções e anseios de vários anos sempre foram silenciados e ignorados pelos parlamentares eleitos que estiveram e estão no Congresso Nacional.
Em 2015, a corte suprema passou a compreender os termos “pederastia” e “homossexual” como discriminatórios e garantiu o direito a adoção por pessoas LGBT+. Três anos mais tarde, o mesmo tribunal evoluiu o entendimento quanto a troca de nome e gênero de pessoas transexuais, quando passou a ser desnecessária a cirurgia de “redesignação sexual” para a realização da troca diretamente nos cartórios. No ano seguinte, o STF deu um passo importante no combate a LGBTfobia, decidindo pelo enquadramento da discriminação contra a população LGBT+.
As ações do Supremo Tribunal Federal podem ter força de lei, mas são a correção de leis que não foram pensadas e feitas para incluir pessoas LGBTs. Assim, é preciso questionar esta ausência de ideais e pautas que contemplem a vivência de todas as pessoas no legislativo. Não podemos esquecer que o Brasil é o país que mais mata pessoas LGBTs no mundo e a falta de pessoas da comunidade na política é um reflexo disso.
A pergunta que fica é: por qual motivo os Projetos de Lei para a garantia de direitos da comunidade LGBT+ não deixam de ser projetos e viram leis no Congresso Nacional? A resposta é muito simples: todas essas propostas foram feitas por parlamentares heterossexuais, que além de não terem sido eleitos a partir da pauta LGBT+, não sentem na pele a importância de tratar temas como esses com densidade e de forma mais séria e rigorosa.
Já passou da hora da população LGBT+ deixar de depender de entendimentos dos Tribunais Superiores! É urgente a criação e aprovação de leis que garantam todos os direitos conquistados nesses tribunais. A comunidade LGBT+ só terá adquirido a igualdade quando seus direitos estiverem positivados nas mesmas leis que constam os direitos da população heterossexual. E como fazemos isso? Precisamos de parlamentares LGBT+ no Congresso Nacional, que tragam em suas campanhas o forte compromisso com a elaboração e aprovação de leis para esse segmento da sociedade.
por William Callegaro
Advogado é coordenador jurídico estadual da Aliança Nacional LGBTI+ e secretário estadual LGBT Socialista.