Acolhimento pode evitar tentativas de suicídio após diagnóstico de HIV

FOTO LULA (Foto: Valter Campanato/Agência Brasil)
“Se eu tivesse encontrado o Posithividades uma semana antes, não teria atentado contra a minha própria vida”. A afirmação é de Cléber Augusto (nome fictício), 38 anos, profissional da saúde que vive numa cidade do interior do Ceará e descobriu seu diagnóstico em junho deste ano. Com vergonha, medo do estigma e do preconceito e por achar que seria o fim da sua carreira profissional, Cléber se desesperou, prescreveu para si mesmo vários Benzodiazepínicos (BZD), incluindo o Mizadolam (medicamento usado no Boa Noite Cinderela), e, na noite de sexta-feira da semana em que recebeu o resultado positivo do seu exame, tomou 40 comprimidos de uma só vez, com vodca.
Antes de tentar tirar a própria vida, Cléber escreveu várias cartas de despedida endereçadas para sua mãe, seu pai, irmão e sobrinhos, todos moradores na mesma cidade. Mas, além da carta, mandou uma mensagem de WhatsApp para a sua mãe, com quem tem forte ligação, pedindo desculpas, sem dar muitas explicações. Desconfiada de que algo errado estava acontecendo, a mãe foi até a casa de Cléber e o encontrou desacordado, junto às cartas. Tratou de jogar as cartas fora e levar o filho para o pronto socorro hospitalar. Deu tempo. Cleber passou por uma desintoxicação e só recuperou plenamente a consciência 60 horas após a tentativa de suicídio.
“No ano passado, tive uma relação desprotegida e me preocupei, mas a pessoa disse para eu relaxar, pois havia doado sangue recentemente. Em junho, comecei a sentir muita dor de garanta, aftas grandes e frequentes, amigdalite e um dermatite que causou escamação em toda a pele. Como profissional de saúde e por atender muitas pessoas que vivem com HIV no consultório, já conhecia os sintomas e fui fazer um teste de farmácia. Deu positivo”, relata.
Era uma segunda-feira. No dia seguinte, chegou mais cedo ao trabalho (ele atua no serviço público de saúde da sua cidade) e fez mais um teste rápido; novamente positivo. Na quarta, foi fazer exame laboratorial a 160 km da sua cidade e marcou uma consulta online com um infectologista para o dia seguinte, a 500 km de distância. “Foi a pior semana da minha vida. Eu tinha, e ainda tenho, muito medo que as pessoas saibam. Até hoje, só a minha mãe sabe do meu diagnóstico”, conta.
Após o internamento, Cléber iniciou tratamento psiquiátrico e ganhou atestado de 15 dias para se recuperar. Logo após a alta, foi para Fortaleza, onde se trata até hoje. No primeiro novo exame após o início do tratamento, com um intervalo de apenas 45 dias, já estava indetectável. “Nesse período inicial eu passava os dias no celular em busca de informações e apoio. Foi quando eu encontrei o Lucian (Lucian Ambrós, fundador da comunidade Posithividades) e me conectei. Ele me acolheu de uma forma que me ajudou muito”, afirma Cléber.
“Eu nunca tive medo de morrer ou das doenças oportunistas que podem surgir. Meu único medo é com o estigma e o preconceito. Ainda é uma preocupação que eu tenho e, por isso, o meu diagnóstico é fechado. Mas, no Posithividades eu me senti acolhido e entendi que não era um ET, não era o único. Foi uma luz no fim do túnel”, completa.
Para as pessoas que descobriram o diagnóstico mais recentemente ou para aquelas que ainda irão descobrir, Cléber dá uma dica: “Respire e tenha a certeza de que não é o fim. Conecte-se e procure apoio, mesmo que virtual, pois você vai encontrar pessoas semelhantes a você, que sabem a dor que você está sentido, te entendem e vão te ajudar. No Posithividades a gente se sente mais forte porque é um segurando na mão do outro”, conclui.
O Posithividades é a primeira comunidade digital de acolhimento de pessoas vivendo com HIV do Brasil. Criada em 2017 por Lucian Ambrós, reúne hoje mais de 350 mil pessoas entre os participantes dos 20 grupos de WhatsApp e os seguidores dos perfis @posithividades e @lucianambros nas diferentes plataformas de redes sociais.